quarta-feira, 25 de novembro de 2009

QUESTIONAMENTO

EDIÇÃO DO ZERO HORA DIA 13/11/ 2009

CONTRA AS DROGAS
Uma nova visão sobre o tratamento dos viciados
Confinar os dependentes químicos em clínicas e fazendas terapêuticas é uma estratégia pouco eficaz de combater a epidemia de crack. Quem alerta é o americano Henry Kranzler, considerado uma das maiores autoridades internacionais de dependência química, que falará aos gaúchos hoje e amanhã, em evento gratuito em Porto Alegre.

Professor de psiquiatria e genética e desenvolvimento biológico da Escola de Medicina da Universidade de Connecticut, com mais de 300 artigos publicados em revistas científicas internacionais, o professor participará do encontro Neuroquímica da Dependência, promovido pelo Hospital Mãe de Deus, a partir das 19h30min de hoje.

Com experiência de mais de 20 anos em pesquisas em genética e tratamento farmacológico para dependências químicas, com apoio do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, Kranzler argumenta que o paciente precisa aprender a lutar contra a droga em sua própria realidade – recebendo acompanhamento e incentivos para se manter longe do vício.

– O problema é que ninguém pode viver internado. Eles têm de viver suas próprias vidas. Então talvez seja melhor ensinar a não usar drogas desde o começo, na sua própria base – analisa.

Confira a entrevista concedida a ZH ontem à tarde pelo psiquiatra no Hospital Mãe de Deus, antes de seu passeio para conhecer o Museu Iberê Camargo:

leticia.duarte@zerohora.com.br

CONTRA AS DROGAS
“Ninguém pode viver internado em hospitais”
ENTREVISTA - Henry Kranzler Médico psiquiatra

Zero Hora – Nós enfrentamos uma epidemia de crack, e os tratamentos existentes parecem pouco efetivos. Há boas experiências em novos tratamentos em outros países?

Henry Kranzler – Os tratamentos não funcionam nos Estados Unidos também. O melhor tratamento provavelmente é a prevenção. Nós não temos boas medicações para tratar a dependência de cocaína, nem de crack. A maior parte dos tratamentos é psicossocial. A melhor estratégia em é conter o paciente associando o bom comportamento a recompensas.

ZH – Como isso funciona?

Kranzler – Tenho uma colega que estuda isso, e o que ela faz: ela tem uma espécie de aquário, sem água, nem peixes. Em vez disso, o aquário é cheio de papéis, e cada um diz: você ganhou U$ 3, ou você ganhou um ticket para o cinema, mas também há prêmios maiores, como uma TV. É como se fosse uma loteria. Se o exame de urina mostrar que o paciente não ingeriu drogas, o paciente pode tirar um papel. E sempre ganha alguma coisa. É uma forma de estimulá-lo a se manter limpo. A dificuldade das medicações é que algo que funciona para uns não funciona para outros.

ZH – Já foram mapeadas particularidades genéticas ligadas ao risco de se tornar dependente dessas drogas?

Kranzler – Sim, mas não está claro qual é o gene específico que identifica o risco da dependência. Já foram identificados genes específicos para o tabaco, para a dependência de álcool, mas, para cocaína, não. Já sabemos que existe alguma origem cromossômica, mas não sabemos qual é o gene específico ainda. Não é como uma Síndrome de Down, que você pode ver a diferença.

ZH – Por que é tão difícil tratar o crack?

Kranzler – É porque a cocaína (da qual deriva o crack) é uma droga muito potente, que atua diretamente no sistema cerebral, e dá muito prazer. Existem estudos com animais que tiveram acesso à cocaína e consomem até morrer, de tanto prazer que sentem. O problema é como interromper o impacto da cocaína no cérebro.

ZH – Nos Estados Unidos, o crack também é uma epidemia?

Kranzler – Era, mas a heroína está se tornando mais popular. Imagino que tem a ver com a tendência internacional da droga.

ZH – O que os pais podem fazer para proteger os filhos?

Kranzler – Os pais têm de prestar atenção, conversar, estar envolvidos com a vida dos filhos. Um dos problemas do abuso de drogas é que os usuários usam droga como uma forma de encontrar prazer em suas vidas. Se você tem outras formas de prazer, isso diminui o risco. Então, essa é uma estratégia importante de prevenção: ajudar esses adolescentes a encontrar outros espaços de prazer.

ZH – No Brasil, uma das dificuldades é encontrar lugares para internar os filhos, pois a estrutura de atendimento é precária. Como é nos Estados Unidos?

Kranzler – Não é tão boa como poderia ser. Também existem muitos programas, mas não são integrados.

ZH – E qual seria o tratamento ideal para crack?

Kranzler – Se alguém viesse se tratar comigo, eu tentaria algumas medicações como o topiramato (contra a fissura) e o incluiria em programas de controle com recompensa.

ZH – O senhor não recomenda a internação dos pacientes?

Kranzler – O problema é que ninguém pode viver internado em hospitais. Eles têm de viver suas próprias vidas. Então talvez seja melhor ensinar a não usar drogas desde o começo, na própria base dos pacientes. Os pacientes precisam é aprender outras fontes de prazer para aproveitar a vida.
Cinco lições
1) Não menospreze o álcool e cigarro: as drogas legais são a principal porta de entrada para drogas mais pesadas, como o crack
2) Preste atenção ao seu filho: estar por dentro da rotina é essencial para a prevenção
3) Invista em atividades prazerosas: geralmente o dependente busca a droga como uma fonte de prazer. Se tiver outras fontes de satisfação em sua vida, terá menos chances de procurá-la na pedra
4) Ofereça recompensas pela abstinência, o que aumenta a adesão dos pacientes
5) Evite a internação: como terá de voltar para casa depois, é melhor que o paciente aprenda a permanecer longe da droga em casa, senão recairá

QUESTIONAMENTO DE ADICTO EM RECUPERAÇÃO
Vana:

A Minha Indignação é :

Veja a loucura deste médico!!!!!! E do jornal ao publicar esta matéria!!!

1º Imagine um cara em síndrome de abstinência aguda em crack, em casa, depois dele já ter levado para o traficante a TV, o som, o botijão de gás etc... Sua mãe vir com um comprimidinho de topiramato ( ahahahahah ) e com o tal aquário. Quero ver esse médico propor este tratamento para aquela mãe que fez uma cela ( dentro da sua casa ) para o filho viciado e mesmo assim ele fugiu, tão noticiada pela RBS.
2º como é que o tal especialista cita o nome do remédio: topiramato ( o cara é patrocinado por alguma indústria farmacêutica ?). Eu tomo esse remédio, e vai por mim, não é lá essas maravilhas, todas as minhas recaídas eu estava tomando topiramato!!!! Além disso, abrem-se precedentes para que o leitor do jornal pratique a automedicação. Sabe-se que ainda hoje se consegue comprar remédios sem receitas por ai.
3º Aos olhos de quem não conhece o problema passa, ao ler esta reportagem, que o viciado em crack é um baita sem vergonha mesmo, imagina só!! Basta dar um comprimidinho e um ingresso para o cinema ou uma bicicleta que o cara larga o vício!! Não pára porque não quer!!!!!!!!!!!!!!!!
4º Para o adicto, cadê suas conquistas próprias, estar limpo por sua própria vontade, por seu bem querer, porque vale a pena viver, e não por um sistema de recompensas ( o tal aquário né!!! ) que muitas vezes é o motivo pelo qual o levou as garras da adicção ativa, no sentido de que os pais sempre compraram materialmente o que não puderam dar emocionalmente.
5º Será que a jornalista publicou tudo o que o médico realmente disse na entrevista ? ou apenas alguns trechos? Comprometendo assim a matéria e pior sendo de uma irresponsabilidade sem tamanho.
6º do que adianta a RBS nos bombardear com a campanha “ Crack nem pensar “ se coloca profissionais para cobrir as matérias ou médicos ditos especialistas que mais atrapalham do que ajudam!!!!!!!!!!!!!!! E outra, temos que parar de achar q porque é americano ( o tal Dr é o Sr sabidão ), aliás, estaria vendido para o hospital mãe de Deus?

Vana!!! Vc que tem o dom da palavra, e é claro se concordar com isso, coloca tudo direitinho, com tuas sábias palavras e manda e-mail para Zero Hora, para essa tal Letícia Duarte, que é a colunista desta matéria., se tu tiveres tempo e achar necessário.
Um bj, me manda o q tu escreveste!
Um bj. Paulo






QUESTIONAMENTO À ZERO HORA

Em resposta a entrevista veiculada neste jornal dia 13/11 gostaria de colocar a importância de discussão sobre o assunto. A opinião de apenas um terapeuta, seja ele formado nos Estados Unidos ou em qualquer outro lugar do mundo, é escassa demais para doença tão séria.
Certamente a extensão do problema, mesmo que superficialmente, é conhecida por toda a sociedade. Não é mais possível nos portamos como avestruzes e ignorá-lo. No entanto, é fundamental uma análise menos rasa. O Brasil possui excelentes profissionais capacitados que convivem diariamente com adictos dentro de clínicas.
Com certeza o tratamento objetiva a inserção do usuário na família e na sociedade e sua conscientização. Disso nonguém discorda.
É, por isso mesmo, estranho que o Dr. Henry Kranzler, tão renomado (gostaria de saber quais órgãos internacionais assim o consideram. A vacuidade de informação me leva a crer que é uma auto titulação) trate um doente de dependência com a técnica Pavloviana do Reflexo Condicionado.
Serão os usuários ratos de laboratório que se treina com uma gratificação ao acertar o caminho do labirinto? Ou cães que aparecerão no próximo filme da Disney sentando e batendo palminhas?
E os tremendos problemas da desintoxicação que podem levar facilmente um adicto à abstinência dolorosa e até paranóica? Qual família está preparada para dar este apoio? A enfrentar este abismo de desconhecidos?
A internação é apenas parte de um processo que levará toda a vida do dependente. A conscientização não se faz através de brindes, mas de terapia prolongada e contínua por terapeutas de profundo conhecimento e humanidade.
Façamos uma divagação:
Usuário afastado da droga em plena abstinência inicial recebe uma barra de chocolate de seu (pretensamente confiável) terapeuta. Cai na risada, pela chocante simplificação e atira na cara do profissional, não antes de quebrá-la inteira. Possível acesso de raiva posterior.
Se tem alguma coisa que fica clara nesta entrevista rasa e carregada de esdrúxula opinião é o desrespeito pelo ser humano que existe, desesperado, atrás de um “viciado”.
Na verdade, este “tratamento” está carregado do mais nefasto item da dependência: a manipulação.
A jornalista Letícia Duarte deveria se inteirar um pouco mais sobre o assunto e não ir a campo crua como foi. Quem sabe ela aprende um pouquinho? Quem sabe alarga os horizontes e faz perguntas mais substanciais? Que esclareçam mais do que uma resposta tão ao gosto do Behaviorismo que os americanos amam por conseguir “fazer uma cabeça”.
Aí vai uma ajudinha:
Dependência é o impulso que leva a pessoa a usar uma droga de forma contínua (sempre) ou periódica (freqüentemente) para obter prazer. Alguns indivíduos podem também fazer uso constante de uma droga para aliviar tensões, ansiedades, medos, sensações físicas desagradáveis, etc.
O dependente caracteriza-se por não conseguir controlar o consumo de drogas, agindo de forma impulsiva e repetitiva. Para compreendermos melhor a dependência, vamos analisar as duas formas principais em que ela se apresenta: a física e a psicológica.
A dependência física caracteriza-se pela presença de sintomas e sinais físicos que aparecem quando o indivíduo pára de tomar a droga ou diminui bruscamente o seu uso: é a síndrome de abstinência. Os sinais e sintomas de abstinência dependem do tipo de substância utilizada e aparecem algumas horas ou dias depois que ela foi consumida pela última vez. No caso dos dependentes do álcool, por exemplo, a abstinência pode ocasionar desde um simples tremor nas mãos a náuseas, vômitos e até um quadro de abstinência mais grave denominado "delirium tremens", com risco de morte, em alguns casos.
Já a dependência psicológica corresponde a um estado de mal estar e desconforto que surge quando o dependente interrompe o uso de uma droga. Os sintomas mais comuns são ansiedade, sensação de vazio, dificuldade de concentração, mas que podem variar de pessoa para pessoa.
Vamos estabelecer a seriedade deste jornal na medida em que publicar, ou não este questionamento e desenvolver este tema vital de forma mais eficiente em vez de se balizar por apenas uma opinião estranhamente vulgar.


Vana Comissoli

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Sobre o alcoolismo e a consciência

Os alcoólatras, ou alcoólicos ou alco-olistas, inventaram nomes mais leves para eles. Para nós. Eu chamava de bêbado, embora isso doesse o suficiente para eu beber mais ainda.
Eles contavam suas histórias, às vezes não tinham coragem de encarar a real e fanta-siavam, ou talvez fossem sequelados. Há mui-tos. Demasiadas lacunas na cabeça de um adicto. As justificativas pululam.
Ouvi de uma psiquiatra: dependente dá nó em pingo d’água. Pensei nisso, vesti a carapuça com raiva de mim mesmo, a parte mais difícil da bronca toda é enxergar-se. Sempre queremos dourar um pouco a pílula, só quando não há mais possibilidades de fuga é que aterrissamos e começamos a caminhada de volta que nunca é volta, mas um olhar mais extenso.
A máscara que eu colocava no alcoo-lismo caiu.


ÁLCOOL
Material cedido pelos
proprietários do site
Anjos da Noite
a quem somos gratos.

O álcool é absorvido principalmente no intestino delgado, e em menores quantidades no estômago e no cólon.
A concentração do álcool que chega ao sangue depende de fatores como: quantidade consumida em um determinado tempo, massa corporal, metabolismo de quem bebe e quantidade de comida no estômago. Quando o álcool já está no sangue, não há comida ou bebida que interfira em seus efeitos.
O uso do álcool causa desde uma sen-sação de calor até o coma e a morte depen-dendo da concentração que o álcool atinge no sangue.
Os sintomas que se observam são:
− Doses até 99mg/dl: sensação de calor/rubor facial, prejuízo de julgamento, diminuição da inibição, coordenação reduzida e euforia;
− Doses entre 100 e 199mg/dl: aumento do prejuízo do julgamento, humor instável, di-minuição da atenção, diminuição dos reflexos e falta de coordenação motora;
− Doses entre 200 e 299mg/dl: fala arrastada, visão dupla, prejuízo de memória e da capa-cidade de concentração, diminuição de res-posta a estímulos, vômitos;
− Doses entre 300 e 399mg/dl: anestesia, lap-sos de memória, sonolência;
− Doses maiores de 400mg/dl: insuficiência respiratória, coma, morte.
Um curto período (8 a 12 horas) após a ingestão de grande quantidade de álcool pode ocorrer a "ressaca", que se caracteriza por: dor de cabeça, náusea, tremores e vômitos.
Ocorre tanto devido ao efeito direto do álcool ou outros componentes da bebida. Ou pode ser resultado de uma reação de adaptação do organismo aos efeitos do álcool.
A combinação do álcool com outras drogas (cocaína, tranqüilizantes, barbituratos, anti-histamínicos) pode levar ao aumento do efeito, e até mesmo à morte.
Os efeitos do uso prolongado são di-versos. Dentre os problemas causados direta-mente podem-se destacar doenças do fígado, coração e do sistema digestivo.
Secundariamente ao uso crônico abu-sivo, observa-se: perda de apetite, deficiências vitamínicas, impotência sexual ou irregu-laridades do ciclo menstrual.

Alcoolismo crônico:
É responsável pelas alterações morfo-lógicas em praticamente todos os órgãos e tecidos do corpo, particularmente no fígado e no estômago.
Somente as alterações gástricas que surgem imediatamente após a exposição pode ser relacionadas com os efeitos diretos do etanol sobre a vascularização da mucosa. A origem das outras alterações crônicas é menos clara.
O aumento da atividade dos radicais livres em alcoólatras crônicos também tem sido sugerido como um mecanismo de lesão.
Seja qual for a base, os alcoólatras crônicos têm sobrevida bastante encurtada, relacionada principalmente com lesão do fí-gado, estômago, cérebro e coração
Problemas clínicos do alcoolismo:
A ingestão contínua do álcool desgasta o organismo ao mesmo tempo em que altera a mente. Surgem sintomas que comprometem a disposição para trabalhar e viver com bem estar.
Alguns dos problemas mais comuns da doença são:
No estômago e intestino:
Gases: Sensação de "estufamento", nem sempre valorizada pelo médico. Pode ser causada por gastrite, doenças do fígado, do pâncreas, etc.
Azia: Muito comum em alcoolistas devido a problemas no esôfago.
Náuseas: São matinais e ás vezes está associ-ada a tremores. Pode ser considerada sinal precoce da dependência do álcool.
Dores abdominais: Muito comum a presença de lesões no pâncreas e no estômago.
Diarréias: Nas intoxicações alcoólicas agudas (porre). Este sintoma é sinal de má absorção dos alimentos.
Lesões no fígado decorrentes do abuso do álcool. Podem causar doenças como hepa-tite, cirrose, fibrose, etc.
No Sistema Cárdio Vascular: Pode ser danoso ao tecido do coração e elevar a pressão san-güínea causando palpitações, falta de ar e dor no tórax.
Glândulas:
Impotência e perda da libido: Pode haver atrofiamento dos testículos, queda de pêlos além de gincomastia (mamas crescidas).
Sangue:
O álcool torna o individuo propício às infecções, alterando o quadro de leucócitos e plaquetas, o que torna frequente as hemorra-gias.
A anemia é bastante comum o que pode ser causado por desnutrição (carência de ácido fólico).
Alcoolismo é doença (OMS):
É o que a medicina afirma, mas a mai-or dificuldade das pessoas é entender como isso funciona. Alguns acham que é falta de vergonha; outros, que é falta de força de von-tade, personalidades desajustadas, problemas sexuais, brigas familiares, etc.; outros, até, que é coisa do "capeta", outros acham que leva algum tempo para desenvolver tal "vício".
A verdade é que algumas pessoas nas-cem com o organismo predisposto a reagir de determinada maneira quando ingerem o álco-ol. Aproximadamente dez em cada cem pes-soas nascem com essa predisposição, mas só desenvolverão esta doença se entrarem em contato com o álcool.
O alcoolismo não é hereditário:
Apesar do alcoolismo não ser heredi-tário existe uma predisposição orgânica para o seu desenvolvimento, sendo, então, o alcoo-lismo transmissível de pais para os filhos. O desenvolvimento do alcoolismo envolve três características: a base genética, o meio e o indivíduo. Filhos de pais alcoólatras são gene-ticamente diferentes, porém, só desenvolverão a doença se estiverem em um meio propício e/ou características psicológicas favoráveis.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

HOMENS E MULHERES QUE AMAM DEMAIS

AOS HOMENS E MULHERES QUE AMAM DEMAIS

DEPENDÊNCIA EMOCIONAL, TIRANIA AUTO INFLIGIDA.


Quando amar significa sofrer, debater-se em criações de problemas estamos amando demais, doentiamente.
"Amar se torna demais quando nosso parceiro é inadequado, desatencioso ou inacessível e, mesmo assim, não conseguimos abandoná-lo." −Robin Norwood−
A dependência emocional se caracteriza por comportamentos submissos, falta de confiança, dificuldade em to-mar decisões, inabilidade para expressar sentimentos e por um temor extremo ao abandono, à solidão e à separação. Incapacidade de dizer NÃO, mesmo sabendo que é o momento apropriado.
È a exteriorização do medo de ficar sozinho. De não bastar-se. Melhor um mau amor que amor nenhum.
É uma tirania que constrói uma prisão interior mediante alianças com o medo, a passividade, a negação da reali-dade e os sentimentos de culpa.
Faz parte do caráter e se nutre de circunstâncias desafortunadas na infância, como todos os nossos comporta-mentos e sentimentos têm sua raiz na infância.
A dependência emocional se manifesta no comportamento afetivo, sexual, profissional e econômico.
O noivado, a lua de mel, “os casais perfeitos” ou as famílias sem problemas são idealizações que não se sustentam por muito tempo. Felizmente, em nossos dias, apesar dos excessos, da descartabilidade,estamos abandonando o amor romântico que é exigente e perfeccionista.
A discussão franca feita com assertividade, pode gerar algum incômodo, mas também traz a verdade dos sentimentos das partes. Calar ou conciliar para não se incomodar, ou por justificativas com: “não vamos estragar bons momentos” é um grande erro. Impede a solução dos problemas. No fundo há um comprometimento com o medo.
A realidade nos demonstra que as famílias mais enfermas são aparentemente perfeitas. As diferenças são tachadas desuperáveis, as discussões são pífias, ou se fala com toda educação e ponderação enquanto por baixo os conflitos rugem. Os sentimentos são secundários, a adequação é mais importante. A realidade torna-se secundária diante das aparências que preservam os laços doentios.
Nessas famílias teatrais são macerados grandes rancores e profundas frustrações.
Na família cuja a prioridade é o campo profissional e que tem dependência emocional, espera-se que forças ex-ternas realizem as mudanças. Estabelece-se a inércia e os objetivos não são alcançados.
A crença dos dependentes baseia-se que toda a mudança desestabiliza o status quo, gerando ansiedade e fragmentação. O que é assustador para os envolvidos, na verdade, repaginar os movimentos da família trará renovação e eliminação de conflitos submersos.
Homens e mulheres dependentes que baseiam suas escolhas de parceiro no socialmente aceitável, politicamente correto, desequilibram-se ao descobrir a mediocridade e a doença por trás da convivência superficial porém emaranhada e enlaçada.
As piores escolhas ocorrem quando baseadas no atrativo físico ou no poder econômico. Cedo ou tarde essas relações se convertem em algo insuportável uma vez que não envolvem sentimentos. O perigo é a tendência de “criar” sentimentos falsos, ou de plástico e crer que são verdadeiros, para isso criam-se grandes emoções também falsas.
Através do medo da liberdade e da solidão se perpetua a dependência emocional e é estabelecido o aprisiona-mento psíquico.
A angústia e/ou depressão exigem tratamento psicológico. O alívio dos sintomas é apenas o começo de um pro-cesso profundo processo de auto-conhecimento, uma vez que a recaída é implícita se não tratada.
A dependência emocional é tão nefasta, ou mais do que a drogadição e alcoolismo devido ao não aparecimento de situações vergonhosas expostas e ao desconhecimento de sua existência enquanto doença.
A PARCERIA, O COMPARTILHAMENTO SÃO DESEJÁVEIS, MAS NÃO OS DEIXEM ANULAR VOCÊ!

quarta-feira, 22 de julho de 2009

A COISA

Tu pensas que poderás dar um gole, um teco, uma fungada... Comprar um cinto, comer um chocolate, jogar uma vez. Matar apenas um.
Engano teu.
Neste mundo nada é feito no singular, tudo é plural, muitas vezes plural. É uma corrente de elos infinitos.
Depois do um, vem o dois, o três... Vêm todos. O primeiro é muito, os outros são poucos. Poderão se engatar pelo resto de tua vida e ela será de desespero.
Mano, isso é uma confissão. Eu senti na pele.
Tu nem te lembras mais como é estar limpo e isso te parece careta, besta, babaca.
Mano, a gente se engana, a gente se troca. A gente vira escroto a serviço, senão virar a mesa.
Estar limpo é ter a vida na mão outra vez. É poder escolher. Podes escolher voltar para a droga de forma controlada, seja lá qual for, mas escorregarás. Não tens domínio sobre ela. Ela tem domínio sobre ti.
Enganas-te também se pensas que não estás preso por que não és usuário de drogas, ou álcool, nem sequer jogas. Se não controlas tuas compras e chegas até a roubar parapossuir, se o computador é teu travesseiro, teu bom dia e tua refeição. Se comer chocolate é tão vital quanto beber água, se não dormes quando não tomas uma boleta, se te arrastas miseravelmente por um amor fodido. E dezenas de coisas mais, tu és um adicto. O bingo, os jogos da Internet, a comida sem limites que cala tua ansiedade. Se achas que podes transar com todo mundo que passar na tua frente e sentires poder ao fazê-lo. Tudo isso, mano é a mesma doença: dependência.
Quando acordares, se conseguires fazer isto, estarás atirado no chão, pano velho descartável. Coisa rota e suja. Por que estarás sujo e, talvez, vomitado, prenhe de vermes.
Os vermes te comem todos os dias, dentro de tua cabeça e fora também, na matéria que te foi dada. Os vermes podem aparecer na parede, no teu corpo e terás medo. Muito medo. Eles ficarão enormes e buscarás, desesperadamente, uma saída.
Todas as portas estarão fechadas, mano. Haverá uma aberta: a recuperação. Sair do lixo, a-bandonar a coisa que te seduz e te humilha.
Mano, sei que precisas disso como o ar que respiras porque te alivia. Te dá o esquecimento.
Esquecer o quê, mano?
Se as coisas não mudam, a menos que tu mudes teu modo de vê-las. São pesadas, bem sei. Porém, não são eternas. Eterna é a coisa que usas para fugir da realidade que não gostas de ver e, pior, de sentir. Enfeias a realidade mais do que ela é.
Depois, mano, tu não sentirás nada e nem saberás por que estás perdido de todos os caminhos e o único caminho aberto é tua alienação. Tu continuarás usando por que ela te pôs num espeto do qual não podes te safar.
A coisa, então, se mostra de verdade, em todo seu negror e seu desespero. A coisa, mano, é isso: desesperança de tudo. Saída sem saída. Beco, tortuosa viela. Desastre aéreo e sucumbível, onde não tens por onde sair. Estás preso, mano. Estás fodido.
É preciso reverter o processo.
Como fazer tal feito?
Tu foste seduzido e a sedução é a pior das armas. Nos engata, nos promete o céu. Vemos o céu. Ilusão, mano, pura ilusão. E dependência mostrará suas garras afiadas. A paixão é difícil de lar-gar, queremos de novo e de novo o que atingimos da primeira vez. Não volta, mano. Jamais voltará. A paixão dá descarga de adrenalina que precisamos porque não agüentamos o tirão da vida. Ficamos dizendo que o nosso foi além da conta a ser paga. Todos dizem, mano.
Houve covardia de encarar. Houve peso e sofrimento que não estava no nosso cardápio. A-creditamos que somos dignos da felicidade. Felicidade... Esta se conquista, mano. Não é dada de graça, precisa de olhos abertos e não da cegueira da droga, do esculhambo que escolhemos. Precisa aceitar que a vida não é justa, isso é invenção dos homens covardes, dos sem fibra para agüentar vi-ver. É história, mano. A vida é conseqüência.
Sabe, mano, o que te conto foi estudado por gente bem mais sábia do que eu. Um deles é Ar-nold Toynbee. Ele diz que quando o ser humano tem pouco desafio, ele não se projeta no mundo. Quando tem muito ele se encolhe.
Pois é, mano, é assim que a gente faz e é. Não somos diferentes do todo, mano. A gente pro-curou atalhos. Quebramos a cara.
Doeu, tu nem te lembra disso? Doeu, mano, podes crer. Doeu prá caralho! Desculpe a má pa-lavra, só ela cabe aqui.
E agora? O que fazer com essa dor, essa experiência que engata cada vez mais gente? O que fazer?
Mano, se unir, se juntar, não em torno da droga que entorpece, como fazíamos, ou como fazes ainda. Precisamos nos unir diante da coragem de ver. Precisamos fazer aquilo que achávamos que fazíamos.
Mano, não mentirei para ti. Estar de cara é pesado como o cão, mas cegos o que podemos fa-zer?
Tenha coragem, mano, vai à luta. Cura-te e vem comigo por que só quem viveu sabe como é a bronca toda.
Vem comigo. Eu preciso de ti, mano. Por nossos manos.
Amo-te.



Vana Comissoli

ADOLESCÊNCIA E AS DROGAS

ADOLESCÊNCIA E ADICÇÃO


DROGAS. Sem

Dra. Analice Gigliotti
Psic: Elizabeth Carneiro
Gisele Aleuia


Baseado em informações do livro acima mencionado. Capítulo referente à adolescência e as drogas:

Adolescer significa adquirir autonomia. Isso é fundamental para a formação de um sentimento de competência e confiança, que, por sua vez, é essencial para uma boa auto estima.
Em plena adolescência, a pessoa sente uma necessidade de viver, experimentar coisas diferentes, sentir o mundo à sua maneira, divergindo muitas vezes do que lhe foi transmitido. Os pais, de uma hora para outra, não sabem mais nada.
Novas experiências, correr riscos antes não vividos _ coisas típicas de qualquer adolescência. Nessa leva está a possibilidade do uso de drogas.
No entanto, há um corte no desenvolvimento da maturidade com a progressão da dependência. Apresenta uma personalidade imatura, dependência de fatores externos, vulnerabilidade. Os relacionamentos que consegue estabelecer são quase todos baseados no consumo de drogas.
Demonstra dificuldade de desenvolver outras formas de divertimento e de descontração. A vida passa a girar em torno da droga.
A droga escraviza o dependente e esse escraviza a família.
Os pais muitas vezes se sentem perdidos e incapacitados de lidar com aquela pessoa que conheciam tão bem e, que agora, se mostra tão diferente. A impotência é o sentimento predominante.
A adolescência traz a necessidade de mudanças no cuidado que a família oferece. Não se pode tratar um adolescente como se trata uma criança. Mas também não se pode tratá-lo como adulto. Ele vive exatamente essa fase de transição – não é uma coisa nem outra.
Ao mesmo tempo em que esse processo traz sentimentos de euforia, pode trazer grandes conflitos.
Os adolescentes já sabem fazer determinadas coisas, mas não sabem outras e têm a tendência de acharem que sabem mais do que na verdade sabem ou sequer vivenciaram.
Se algumas coisas não eram claras nem para os donos da casa, na adolescência isso será posto em xeque. O adolescente questionará tudo, principalmente o que for ambíguo ou inconsistente. Pode ser um momento muito rico para a família, traz a possibilidade de reciclagem, uma atualização.
Os conflitos não trabalhados e não enfrentados podem levar ao uso e abuso de drogas.
O adolescente que se sente amarrado ou culpado por querer respirar outros ares que não os de sua família tende ao uso de drogas como uma tentativa (torta) de separação e de individuação. Ao usar drogas e freqüentar um grupo completamente distinto do seu, é como se estivesse dizendo: “Sou diferente”.
Apesar de demonstrarem clara oposição aos pais, os adolescentes precisam de sua família. Quando se sentem inseguros, frustrados e cansados, precisam ter para onde voltar e pessoas em quem confiar.
Fatores que contribuem para o uso de drogas por adolescentes:
• Uso precoce do álcool;
• Desempenho escolar insatisfatório;
• Antecedentes de eventos estressantes ou traumatizantes;
• Relacionamento ruim com os pais;
• Baixa auto-estima;
• Ausência de normas e regras claras;
• Tolerância do meio às infrações;
• Necessidade de novas experiências e emoções;
• Baixo senso de responsabilidade;
• Pouca religiosidade.
Quanto mais cedo se desenvolve a dependência química, maior a probabilidade de ocorrerem prejuízos cognitivos e emocionais. O uso afeta diretamente a cognição − capacidade de julgamento, humor, relações inter pessoais – podendo comprometer uma adolescência regular.
O álcool e as drogas têm o poder de aumentar ou despertar um comportamento agressivo. Aos poucos o descontrole emocional passa a ser a atuação da pessoa que perde o senso crítico de perceber seu comportamento distorcido. O que ela tenta desesperadamente é manter o uso da substância que a escraviza. Perde a capacidade de questionar. Cria a ilusão de que conhece tudo e já é capaz de administrar a vida sozinho.
Libertar-se de uma droga não é uma questão de força de competência. É uma questão de “saber como” e estar adequadamente aparelhado. Isso inclui psico-terapias e muitas vezes auxílio de tratamento farmacológico.
É comum a adicção ser acompanhadas de comoborbidades que precisam ser tratadas junto com a dependência.
De longe, a droga que mais associa crises psicóticas é a maconha. Essas psicoses podem ser reversíveis com a suspensão da droga. Mas algumas podem levar meses, ou anos, podem desencadear esquizofrenia em que o indivíduo sofre de redução do pragmatismo e embotamento do afeto.
Este artigo, embora use linguagem coloquial e acessível é baseado no estudo de três profissionais especializadas em adicção. Têm elas muita vivência e pesquisa de evidências científicas. Nada do que partilham é “achômetro”. É aquilo que a comunidade científica mundial acredita e comprova.
Se você já se deu conta que sua vida está complicada ou estacionada pelo uso de drogas, procure ajuda antes que ela coma você.
Se tem dúvidas sobre o grau de seu uso, procure ajuda.
Se nega sua dependência, procure ajuda.
Não espere ficar difícil demais.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

TUDO TEM SEU PREÇO


Marion se posta estática diante da vitrine. Os músculos tensos e o coração em ritmo acelerado.
Os objetos expostos, vestidos, acessórios, bijuterias são feitos de neon e faíscam. Alguns cochicham:
− Me leva, me leva. Precisas de mim e estou me sentindo tão sozinho.
Os sapatos caminham e se posicionam abaixo dos vestidos, alguns batem a pontinha da frente com impaciência.
Uma salsa principia a tocar.
As luvas tomam postura de dança. A mão direita segura a manga e a esquerda conduz pelas costas um belo vestido azul anil, numa performance de contos de fadas.
Marion está encantada.
As luzes aumentam de intensidade, se tornam holofotes que giram focando os dançarinos.
A boca da moça saliva e uma ansiedade gigante faz com que estenda os braços até as mãos encontrarem a fria barreira dos vidros.
Entra na loja com o carrinho de bebê da filha trombando aqui e ali.
É um magazine. As ofertas brilhando cores surrealistas.
Passa as mãos nos tecidos, não importa se linho, algodão ou seda. Todos enchem seus dedos de desejo.
Repete para si mesma. Eu preciso, eu preciso.
A angústia aumenta.
Debruça-se sobre o balcão das bijuterias, os brincos, pulseiras, gargantilhas, são ícones diante dos quais se ajoelha.
Êxtase que precisa possuir. As mãos suam.
A filha chora. Ela enfia-lhe a chupeta na boca e embala o carrinho com quase violência.
− Pois não, senhora? Posso ajudá-la?A vendedora é um anúncio de cosméticos e o sorriso uma publicidade da Colgate.
Marion também quer ser alguém identificável, atrair olhares, admiração. Se captar inveja o coração se encherá de orgulho.
Balança os longos e mechados cabelos que escorrem quase até a cintura. Sabe que é bonito, não combina mais com seus trinta anos e coloca-lhe um ar levemente prostituído. Esse descartável detalhe ela não vê. Vê apenas que a olham ao balançá-los.
− Pode ajudar e muito.
Pobre atendente derramará sobre o balcão a mercadoria estrategicamente arrumada na vitrine. Todas serão experimentadas uma a uma numa exibição interminável.
A cabeça de Marion vire e revira diante do espelho que denunciará os brincos mais brilhantes. Aproxima as pulseiras procurando a combinação perfeita. O coração bate Tum Tum strass.
− Todas são perfeitas! Vou levar este com aquela... Estou precisando demais de azul.
Coloca tudo no cesto de compras e segue o cruzeiro sedutor através dos corredores. De vez em quando um suspiro. Começa a acalmar-se no meio das blusas e dos vestidos pendurados. Um calor bom aquecendo o peito e aliviando.
Roça-se pelos tecidos, um sorriso parado. Os olhos não enxergam ninguém, apenas os desejos expostos alinhadamente. O sabor do pecado que acalma. Satisfação.
A filha chora de novo. Fala palavras calmantes para ela:
− Olha querida, que coisas lindas. Mamãe comprará muitos vestidos lindos para ti. Cachuchas e laços.
Oferece a mamadeira. A criança se aquieta.
Suspiro.
Poderá circular na igreja do consumo por mais meia hora sem apelos da filha que aprende.
Escolhe um vestido, duas blusas e um par de sapatos para combinar. Convenhamos: irresistíveis.
Não experimenta nada. Para quê? A melhor parte é reunir tudo no cesto e sentir o poder da aquisição.
À hora do caixa é consequência a driblar.
Abre a carteira e derruba sobre o balcão vários cartões de crédito. Com voz de quem não está nem aí, resolve:
− Vou pagar com cheque. Dão alguns dias?
A moça do caixa responde sorrindo profissionalmente que sim, dão trinta dias.
− Beleza!
Marion fala com aparente displicência. Por dentro a cabeça é uma calculadora decidindo entre os números que levará tudo.
Em casa.
Tira todas as etiquetas e coloca sob todo o lixo junto com as sacolas com a logo da loja. São dedos duros de sua loucura. Em seguida já as despacha na lixeira coletiva.
O marido nunca faz esse trabalho, nada verá. Não há assinatura em lixo. Mas vá que...
Guarda as bijus bem misturadas com as antigas. Homem é tão distraído! Nunca presta atenção em brincos. São uns bobos.
As peças de roupa vão para o fundo do armário, atrás das roupas da próxima estação fora de uso agora.
Põe a filha no berço. Liga a TV. Não acompanha a programação, arquiteta estratagemas para que as compras possam aparecer de forma ingênua. Presente. Doação de amigas. Até isso serve.
Por dois ou três dias está calma. Enfrenta a rotina sem atirar as panelas e faz uma faxina da pesada.
Às vezes pára frente à TV, mas só quando as atrizes aparecem com lindos vestidos assinados por grifes famosas, penteados mechados, dentes novos recém clareados no dentista à custa de bastante dor e dinheiro.
A sensação de preenchimento começa a se desvanecer.
− Ai, o aperto de novo! Não quero sentir. Não quero.
Rabaneia em direção à cozinha. Tem um pote de castanhas quase cheio sobre o balcão. Em pé mesmo começa a roer. Os olhos buscando o Rivrotril. Se tomar o remédio alivia, senão... Viro bicho. Que saco! Sei que não sou louca. É esta vida de merda que me consome.
A filha chora chamando-a.
− Agora não, choro agora não.
Toma uma decisão conclusiva nada definitiva. Igual a ela mesma.
− Vou ao shopping, não... À lojinha da esquina. Tem umas coisas lá que preciso. Muito. Não devia ter parado de fumar. Aliviava. Agora não suporto o gosto. Merda! Ao supermercado não irei. Qualquer lugar que vendam. Eu vou.
Caminha pela casa sem atentar no que faz. Robotizada, coloca roupas na máquina, algumas sem uso. Prepara um almoço à meia boca em meia hora.
Beija o marido, distraída.
− Preciso sair, preciso sair. – Seu pensamento fixo. – só olharei, não comprarei nada.
Está na rua. Empurra o carrinho da filha que sacoleja no descuido do calçamento. A sacola está bem abastecida de balas e bombons tranquilizantes. Daniela aprende.
Todos a conhecem no supermercado vizinho. Um segurança brinca com a menininha e acompanha o vai e vem da mãe com olhos atentos.
Coloca no cesto algumas banalidades: pãezinhos, leite, queijo. No montante que os vales alimentação ainda cobrem.
Na bolsa do carrinho do bebê vão os chocolates, salgadinhos, as castanhas das quais já está enjoada. Comeu dois potes de uma só vez na semana passada.
Na saída é abordada pelo segurança constrangido.
− Dona Marion posso ver suas compras? As que guardou no carrinho da Dani?
O coração estremece, tem uma sensação de desmaio. Agarras-se ao balcão e fecha os olhos.
Abra-se terra e me coma. Demônios dos infernos me busquem. Fui pega.
Explicações mal costuradas. Não cabia no cesto nossa nem percebi é o hábito...
Assina outro cheque, um avião Boeing. Seu banco chama EMBRAER.
A vergonha, o flagra atira-a sobre a cama em choro convulsivo. Reza pedidos silenciosos pela ajuda de todos os santos, em especial Santa Rita de Cássia – a santa dos impossíveis e Santo Expedito – o santo das causas urgentes.
Busca desenfreada por explicações mentirosas e justificativas de pés de barro. O caos, o poço sem fundo.
Durante duas semanas vive o inferno. No entanto, as lembranças são nuvens se esgarçando no céu.
Arruma a filha com esmero, organiza o equipamento de passeio e decora a promessa:
− Vou olhar. Só olhar... Até o mês que vem quando vier o salário. Bem...
Vai trilhando a rua com olhos buscando vitrines. Pára na porta de uma loja de um e noventa e nove.
− Bem isso é baratinho. Preciso tanto dessas cremeiras!

COMPRADORES COMPULSIVOS




O ato de comprar compulsivamente é uma doença, com sintomas específicos, sua patologia e sua recuperação. Ela provoca tantos estragos na psique quanto a drogadição. Causa ansiedade e depressão. Estes sintomas são amainados no ato de comprar, para retornarem em seguida e provocar novas sensações desagradáveis.
Como qualquer outra doença adictiva a compulsão por compras visa aliviar os processos de sofrimento interno sem, no entanto, solucioná-los. Poderíamos cahamá-la de fuga de enfrentamento da dor.
Entenda as formas de interpretar o comportamento típico do comprador compulsivo.

Como identificar um comprador compulsivo?
De um modo geral apresentam uma obsessão por comprar muito mais do que precisam ou do que podem pagar. Muitos compram o mesmo artigo repetidamente pelo simples fato de comprar alguma coisa, sem avaliar se o objeto é ou não importante para seu quotidiano. É comum que nem sequer venham a utilizá-los.

Quais são os sintomas deste comportamento?
Não resistir ao impulso de comprar mesmo gastando acima do seu plano financeiro, assumindo dívidas e prejudicando o orçamento mensal. Com isso prejudicam os planos das pessoas à sua volta. Se for preciso procuram créditos para conseguir pagar suas dívidas Sentem compulsão de comprar o produto no primeiro momento que o vê e têm consciência de que os produtos adquiridos não têm qualquer utilidade para si, mas criam justificativas para acalmar a culpa sobre o ato.
O que origina esse tipo de comportamento?
Cria-se a ilusão de que, por meio dos seus comportamentos compulsivos, controla a forma como lida com os seus sentimentos. A compra compulsiva torna-se uma forma de encontrar um sentido emocional para sua vida. Quando compra, o indivíduo sente-se preenchido.

O comportamento do comprador compulsivo é semelhante ao de algum outro paciente que tenha desvio psicológico?
Como as demais dependências, é um processo lento e progressivo. Passa a depender deste processo para sentir algum conforto na sua vida, e na procura da sua identificação pessoal. A vida transforma-se numa procura do prazer através das compras. O comprador sabe que esta via não lhe traz felicidade, mas não consegue substituto para se sentir melhor consigo mesmo. Esta é uma das características de todos os indivíduos que possuem uma personalidade aditiva

A compra pode ser considerada, nestes casos, um vício?
O processo de comprar de forma patológica tem início com um conjunto de experiências que trazem uma sensação de mudança no estado do humor. No início a pessoa não percebe o problema, apenas sente que quando compra consegue alterar o seu estado de humor.
Ao fazer as compras, o que difere o homem da mulher?
Ao longo dos tempos, as diferenças entre homem e mulher têm diminuído. Era mais comum nas mulheres, mas a ansiedade e streess de nosso tempo tem atingido também os homens. Infelizmente, os homens são mais resistentes a procurar ajuda.

AM: Como saber se estou exagerando na hora de comprar?
Se achar que é muito difícil resistir ao impulso de comprar gastando mais do que aquilo que ganha, e suas dívidas se começarem a acumular, é provável que esteja exagerando nas suas compras. Se acalma sua ansiedade ao comprar e não consegue resistir a um apelo mesmo sabendo que é desnecessário é provável que esteja desenvolvendo a doença.
Se eu perceber que sou um comprador compulsivo, o que devo fazer?
O que deve ser feito em todas as dependências: admitir de uma forma honesta consigo mesmo que tem um problema, que não consegue mais administrar sua vida neste sentido. Em seguida aceitar que a partir do momento em que faz a primeira compra fugindo do planejamento mensal, não parará sem ter comprado coisas que não precisa, iniciando o processo de novo.

Como posso me tratar sozinho?
Iniciando um processo de tratamento desta patologia, o que é extremamente difícil sem a ajuda de um técnico habilitado. Existem relatos de alguns indivíduos que conseguem parar de comprar. No entanto, como não resolveram o problema que está por trás de seu comportamento, mudam de objeto e continuam com comportamento compulsivo noutra área, como sexo, álcool, jogo e até drogas. A doença não é a compra em si, mas a dependência por compulsão.

Que conselhos podem ser dados a um comprador compulsivo?
Procurar desenvolver relação com outras pessoas obtendo a gratificação de sentir que é amado e respeitado pelos outros. Ser carinhoso consigo mesmo e tratar bem de si, alimentando-se de forma saudável, praticando desportos, não cometendo excessos. Estar atento à forma como procura mudar o seu estado de humor. E não começar a esconder ou dissimular aos seus amigos comportamentos que o envergonhem ou o façam sentir desconfortável. A terapia torna-se uma necessidade para aprender os mecanismos que o levaram à dependência e aprender a administrá-los.
Quais são as características que definem um bom comprador?
O bom comprador poderá ser o indivíduo que compra aquilo que necessita para a sua vida no quotidiano, levando em conta o seu orçamento. Depois de fazer as contas mensais, o bom comprador se permite oferecer presentes a si e aos outros dentro de suas possibilidades, sem envergonhar-se de quantidade ou valores.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A COISA


Tu pensas que poderás dar um gole, um teco, uma fungada... Comprar um cinto, comer um chocolate, jogar uma vez. Matar apenas um.
Engano teu.
Neste mundo nada é feito no singular, tudo é plural, muitas vezes plural. É uma corrente de elos infinitos.
Depois do um, vem o dois, o três... Vêm todos. O primeiro é muito, os outros são poucos. Poderão se engatar pelo resto de tua vida e ela será de desespero.
Mano, isso é uma confissão. Eu senti na pele.
Tu nem te lembras mais como é estar limpo e isso te parece careta, besta, babaca.
Mano, a gente se engana, a gente se troca. A gente vira escroto a serviço, senão virar a mesa.
Estar limpo é ter a vida na mão outra vez. É poder escolher. Podes escolher voltar para a droga de forma controlada, seja lá qual for, mas escorregarás. Não tens domínio sobre ela. Ela tem domínio sobre ti.
Enganas-te também se pensas que não estás preso por que não és usuário de drogas, ou álcool, nem sequer jogas. Se não controlas tuas compras e chegas até a roubar parapossuir, se o computador é teu travesseiro, teu bom dia e tua refeição. Se comer chocolate é tão vital quanto beber água, se não dormes quando não tomas uma boleta, se te arrastas miseravelmente por um amor fodido. E dezenas de coisas mais, tu és um adicto. O bingo, os jogos da Internet, a comida sem limites que cala tua ansiedade. Se achas que podes transar com todo mundo que passar na tua frente e sentires poder ao fazê-lo. Tudo isso, mano é a mesma doença: dependência.
Quando acordares, se conseguires fazer isto, estarás atirado no chão, pano velho descartável. Coisa rota e suja. Por que estarás sujo e, talvez, vomitado, prenhe de vermes.
Os vermes te comem todos os dias, dentro de tua cabeça e fora também, na matéria que te foi dada. Os vermes podem aparecer na parede, no teu corpo e terás medo. Muito medo. Eles ficarão enormes e buscarás, desesperadamente, uma saída.
Todas as portas estarão fechadas, mano. Haverá uma aberta: a recuperação. Sair do lixo, abandonar a coisa que te seduz e te humilha.
Mano, sei que precisas disso como o ar que respiras porque te alivia. Te dá o esquecimento.
Esquecer o quê, mano?
Se as coisas não mudam, a menos que tu mudes teu modo de vê-las. São pesadas, bem sei. Porém, não são eternas. Eterna é a coisa que usas para fugir da realidade que não gostas de ver e, pior, de sentir. Enfeias a realidade mais do que ela é.
Depois, mano, tu não sentirás nada e nem saberás por que estás perdido de todos os caminhos e o único caminho aberto é tua alienação. Tu continuarás usando por que ela te pôs num espeto do qual não podes te safar.
A coisa, então, se mostra de verdade, em todo seu negror e seu desespero. A coisa, mano, é isso: desesperança de tudo. Saída sem saída. Beco, tortuosa viela. Desastre aéreo e sucumbível, onde não tens por onde sair. Estás preso, mano. Estás fodido.
É preciso reverter o processo.
Como fazer tal feito?
Tu foste seduzido e a sedução é a pior das armas. Nos engata, nos promete o céu. Vemos o céu. Ilusão, mano, pura ilusão. E dependência mostrará suas garras afiadas. A paixão é difícil de largar, queremos de novo e de novo o que atingimos da primeira vez. Não volta, mano. Jamais voltará. A paixão dá descarga de adrenalina que precisamos porque não agüentamos o tirão da vida. Ficamos dizendo que o nosso foi além da conta a ser paga. Todos dizem, mano.
Houve covardia de encarar. Houve peso e sofrimento que não estava no nosso cardápio. Acreditamos que somos dignos da felicidade. Felicidade... Esta se conquista, mano. Não é dada de graça, precisa de olhos abertos e não da cegueira da droga, do esculhambo que escolhemos. Precisa aceitar que a vida não é justa, isso é invenção dos homens covardes, dos sem fibra para agüentar viver. É história, mano. A vida é conseqüência.
Sabe, mano, o que te conto foi estudado por gente bem mais sábia do que eu. Um deles é Arnold Toynbee. Ele diz que quando o ser humano tem pouco desafio, ele não se projeta no mundo. Quando tem muito ele se encolhe.
Pois é, mano, é assim que a gente faz e é. Não somos diferentes do todo, mano. A gente procurou atalhos. Quebramos a cara.
Doeu, tu nem te lembra disso? Doeu, mano, podes crer. Doeu prá caralho! Desculpe a má palavra, só ela cabe aqui.
E agora? O que fazer com essa dor, essa experiência que engata cada vez mais gente? O que fazer?
Mano, se unir, se juntar, não em torno da droga que entorpece, como fazíamos, ou como fazes ainda. Precisamos nos unir diante da coragem de ver. Precisamos fazer aquilo que achávamos que fazíamos.
Mano, não mentirei para ti. Estar de cara é pesado como o cão, mas cegos o que podemos fazer?
Tenha coragem, mano, vai à luta. Cura-te e vem comigo por que só quem viveu sabe como é a bronca toda.
Vem comigo. Eu preciso de ti, mano. Por nossos manos.
Amo-te.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

AOS HOMENS E MULHERES QUE AMAM DEMAIS



DEPENDÊNCIA EMOCIONAL, A TIRANIA INTERIOR.


"Quando amar significa sofrer, estamos amando demais."
"Amar se torna demais quando nosso parceiro é inadequado, desatencioso ou inacessível e, mesmo assim, não conseguimos abandoná-lo." −Robin Norwood−
A dependência emocional é o medo da liberdade e se caracteriza por comportamentos submissos, falta de confiança, dificuldade em tomar decisões, inabilidade para expressar desacordos e por um temor extremo ao abandono, à solidão e à separação.
É uma tirania encarregada de construir nossa prisão interior mediante alianças com o medo, a passividade, a negação da realidade e os sentimentos de culpa. Faz parte do caráter e se nutre de circunstâncias desafortunadas na infância de cada um. A dependência emocional se manifesta no comportamento afetivo, sexual, profissional e econômico.
O noivado, a lua de mel, “os casais perfeitos” ou as famílias sem problemas são idealizações que não se sustentam por muito tempo. A discussão franca pode gerar dor, raiva e dúvidas, porém é a única maneira de se chegar ao fundo das diferenças. Calar ou conciliar por comodidade, para não se incomodar, ou por justificativas com: “não vamos estragar bons momentos” é um grande erro. Impede a solução dos problemas.
A realidade nos demonstra que as famílias mais enfermas são aparentemente impecáveis. Ninguém levanta a voz, não se discute, não há grandes diferenças ou se fala apenas com toda educação e ponderação. Os sentimentos são secundários, a adequação é mais importante. Ao revés da realidade.
Nessas famílias onde tudo aparenta harmonia e doçura, compreensão, cozinham-se, em segredo, grandes rancores e profundas frustrações.
Na família profissional, se o empresário intui a necessidade de empreender grandes mudanças para superar dificuldades, mas espera que forças externas executem as ditas mudanças, a falência ronda. A crença dos dependentes inclui: “Para que me incomodar, questionar a honestidade, criticar minha funcionária, exigir mudança de meu cônjuge, falar claro e com sentimento ao meu filho se isso pode causar desequilíbrio? Deixa como está que funciona.”
Homens e mulheres dependentes que baseiam suas eleições de par no socialmente aceitável, levam grandes sustos quando descobrem a mediocridade por trás da fachada.
Escolhas baseadas em adequação que correspondam ao que é esperado de nós são catastróficas, pois não levam em consideração os sentimentos reais.
As piores escolhas ocorrem quando baseadas primordialmente no atrativo físico ou no poder econômico. Cedo ou tarde essas relações se convertem em algo insuportável.
Através do medo da liberdade se perpetua a dependência emocional e é confirmado o aprisionamento.
Quando tais circunstâncias geram angústia e/ou depressão, é provável que para aliviar tais sintomas seja necessário tratamento psicológico. É importante saber que o alívio dos sintomas é apenas o começo de um processo profundo de auto-conhecimento.
Um dos primeiros passos no processo de independência é combater a fascinação pela comodidade: "EU QUERO SER LIVRE, PORÉM NÃO QUERO RENUNCIAR À MINHA COMODIDADE".
Isso é obviamente impossível, pois a liberdade é conquistada através de empenho cotidiano. Assim como a recuperação de qualquer outra dependência.
Pensamos que dependência, adicção, pertencem apenas às drogas, ao álcool e ao jogo. Tal conceito é errôneo. A dependência emocional, assim como outras, provoca os mesmos sentimentos de perda, depressão, ansiedade, falta de coragem, submissão que as dependências químicas. E é trabalho a ser realizado pelo resto da vida, assim como quem tem asma precisa sempre estar alerta para uma possível crise. Não tem cura, tem recuperação. É muito perigoso, pois é progressivo. É a "doença" do "ainda": ainda não fez coisas insanas, mas vai acabar fazendo, podendo até levar à morte por causa da tensão excessiva que é causada por esse "vício". Sozinhos não podemos lidar com esse transtorno; só através de grupos de auto-ajuda e com psicoterapia. Não apenas as mulheres são acometidas por esse transtorno, os homens também. Eles se apresentam obcecados pelo trabalho, por esporte ou por hobbies, até mesmo por outras dependências, como o álcool e as drogas. As mulheres, por forças culturais e biológicas, são mais acometidas desse mal, com forte tendência a se tornarem dependentes de relacionamentos com homens complicados, difíceis e distantes. Transformam-se em “infelizes por profissão”.
"Se quisermos mudar nossa vida, é mais importante mudarmos as atitudes do que as circunstâncias. A menos que mudemos as atitudes, é improvável que as circunstâncias, realmente, possam mudar um dia." Robin Norwood
Conquista tua liberdade, ama de verdade os demais, porque um dependente emocional não conhece o amor real, conhece a necessidade. Os outros não são como você imagina, aceita-os como são e promove questionamentos se forem necessários, mas embasados em problemas também reais e não em tuas carências.
Conquista tua liberdade. Valoriza-te, evita frustrantes dependências, não te anules e não deixes que ninguém te anule ou anule tua vontade. E, consequentemente, não deixes que alguém se anule ao teu lado. Só alguém livre pode criar relações serenas e construtivas nas quais se vive o verdadeiro amor. E só terás a certeza de ser amado se tiveres contigo alguém que fica por que quer e não por que precisa. "UNIR-SE SEM IGUALAR”.



terça-feira, 19 de maio de 2009

CO-DEPENDÊNCIA SIMBIÓTICA


Tendo a personalidade adictiva maturado e sobrepujado o Eu verdadeiro que tenderá a diminuir e, nos casos fatais, a desaparecer, a relação adictiva se estabelece com força.
Análise sobre os meandros da relação adictiva estão especificados em outro artigo centrado nesse assunto. Agora analisaremos a SUBSTITUIÇÃO.
Quando um adicto não aceita, real e profundamente, sua condição de dependente que o levará a desenvolver seu Eu verdadeiro, pode ter aceitado ter um "vício", achando que este solucionado tudo ficará bem. A doença da Dependência é mais séria, muito mais mesquinha e trágica do que isso.
Esse é um artigo experimental baseado na observação de um caso estabelecido nas bases que serão aqui apresentadas.
Um adicto na ativa que se conscientiza do mal que o objeto de adicção está lhe provocando poderá fazer grande esforço para reduzi-lo a níveis aceitáveis, ainda assim a doença se manterá intocada uma vez que trabalhou apenas o externo. É nessa condição que a Substituição se estabelece.
Os caminhos mais comuns são de substituir o objeto de adicção, por exemplo, o álcool, por jogo, comida, etc. O mesmo acontece com as drogas onde o usuário ficará pulando de uma para outra e até mesmo chegará à dependência de remédios. Espera-se que seja pelos psicotrópicos e assemelhados, mas há casos em que o objeto de adicção foi deslocado para o inocente analgésico. Em superdoses pode provocar a buscada alteração de humor e levar à sonolência bem vinda para o adicto. A sonolência é o destino final de fuga para os problemas ou situações psíquicas que não consegue controlar ou administrar. Em última instância é a fuga do sofrimento.
É comum que um adicto encontre outro adicto para parceiro. Para usarem juntos sua droga de preferência. Muitas vezes essa convivência simbiótica se rompe se o parceiro for um usuário mais violento e com isso dará ao outro a noção de perigo que atravessam. Então, o mais lúcido diminuirá sua cota de objeto de adicção, mas não se livrará da doença e seu objeto de adicção passará a ser o parceiro.
É comum que não o ame e nem se apiede realmente, mas não rompe a relação. É como se estivesse na frente de um copo ou de uma dose: sabe aonde chegará, mas se mantém fiel. A compulsão impede que haja um real rompimento uma vez que não trata a doença.
A compulsão é a ferramenta mestra da Dependência, é ela que mantém o adicto aprisionado. Só chegando às raízes de sua personalidade adictiva adquirida na primeira infância dentro do meio familiar onde se desenvolveu é que consegue controlá-la. Isso é conquistado pela consciência da dependência e por psicoterapia. Os remédios auxiliares aliviarão a pressão para que haja movimento da parte do adicto em direção à recuperação, mas não curam. Esse ponto é nevrálgico. OS REMÉDIOS NÃO CURAM.
A situação de co-dependência estabelecida dentro deste tipo de relação permite que o usuário mais agudo continue seu uso, livre do controle imposto pelas famílias. As etapas de comportamento reativo das famílias inexistem. O parceiro não estimula a recuperação para não perder seu próprio objeto de adicção que é o outro.
Como se dá tal transferência?
Antes de mais nada é importante analisar o script de vida do adicto. Normalmente desenvolveu a adicção para escapar da dor de se sentir deslocado, imprestável para o mundo que o cerca. É o que podemos chamar de desvalidação. O processo é extremamente doloroso. É a total anulação da capacidade de se desenvolver enquanto ser humano e, principalmente a incapacidade de concorrer com seus iguais. Sempre será o último da fila. Provavelmente, na infância, foi substituído por alguém que considerou melhor ou mais capacitado para usufruir o amor dos pais.
Ao se estabelecer a dependência sobre um adicto sob a aparente forma de salvação do mesmo, necessita que este se mantenha adicto. Procura nessa fonte degradante uma validação para si mesmo. Sente-se melhor porque existe alguém mais deteriorado do que ele próprio. É a mudança de humor ansiada para alívio de suas próprias tensões internas.
Como toda a adicção, esta também aumentará com o tempo e o uso, se podemos chamar assim. Na verdade, usar pessoas é mais corriqueiro do que desejaríamos que fosse. Então os malefícios da adicção crescem e a relação se torna quase insuportável, assim como o álcool e a droga destroem o usuário, a convivência destrói o adicto emocional. Ainda assim não abandonará o parceiro e, inclusive, é possível que tente ajudá-lo sabendo que não conseguirá. Se conseguir, o jogo se romperá e ele perderá sua "droga" de preferência.
O processo acontece em cima dessas premissas:
"O outro igual a mim é confortável, pois não me julga ou condena. Me aceita, e, muitas vezes, me favorece momentos em que posso me mostrar sem nenhuma máscara ou cuidado social."
"Manter a co-dependência me livra de ME VER, me perceber, me admitir doente. Se esse elo for cortado, terei que enxergar uma corrente muito maior, com implicações profundas e dolorosas. O outro igual a mim, me alimenta. Me fortalece em minhas limitações. Não preciso me ver e muito menos me superar. Isso não é esperado de mim, não deseja essa consciência que terminaria com a farsa vivida. Eu desejo que ele permaneça como está. Desta forma seguimos em "tribo". Tribo dos desvalidos, dos não amados, dos frágeis e outros componentes destrutivos deste quilate que revelam minhas incapacidades.
Se o processo for estabelecido dentro de uma família, são grandes as chances que todos os seus membros desenvolvam a mesma patologia comportamental com algumas variantes, mais ou menos, agudas dentro da visão de resposta individual. De qualquer forma é uma situação difícil de ser rompida a menos que um dos componentes de ascendência implodam o jogo e estabeleça bases mais sadias.
Desmontar a relação estabelecida incluirá mudar o rumo de sua vida ou encontrar outro adicto disposto a partilhar com ele o processo destrutivo. As duas coisas são difíceis e amedrontadoras.
O que existe de trágico nessa dependência é que ela possui justificativas válidas para o status quo. Como largar a pobre criatura adicta à própria sorte? Se for casal e tiverem filhos, como abandoná-los a essa sorte? E assim por diante. Ao mesmo tempo em que essas justificativas o salvam da decisão de mudança, fazem com que se sinta bem aos próprios olhos: está tentando, não é culpa dele se o outro não colabora mantendo-se agarrado à adicção.
É uma terrível forma de adicção, pois é maquiada por solidariedade com o adicto ativo, preocupação pelas pessoas dele dependentes e não têm nenhum estímulo adictivo químico (se tiver, estará sob razoável controle), ou seja, é invisível. E as saídas da situação terão, aparentemente, ingredientes de crueldade, uma vez que será preciso afastar-se do adicto, romper vínculos, estabelecer novas metas, pelo menos até recuperar a si próprio para poder socorrer verdadeiramente o parceiro.
Quanto à questão de ajudar um adicto nunca devemos esquecer que por mais que tenhamos conhecimento claro de sua doença, quem tem que adquirir essa certeza é o próprio adicto e ele é quem definirá sua posição diante da recuperação. O máximo possível é acompanhá-lo pelos caminhos que terá que trilhar. Caminhos novos e, em princípio, de sofrimento até que a consciência da libertação se faça. Mas uma vida inteira de aprisionamento vale mil vezes, os poucos meses de indignação consigo mesmo.
Consciência e admissão da doença e dos processos doentios é a única forma de achar o caminho da recuperação. Caminho árduo que exige coragem, humildade e determinação férrea. E que oferece em troca, tranqüilidade, alegria legítima e crescimento emocional e psíquico.

NOITES E DIAS OCULTOS







Grupo Lux – N.A. –Fpolis – SC

Oba! Sexta-cheira!
Ríamos entusiasmados com a perspectiva enquanto alguém arrumava as carreiras cuidadosamente sobre a mesa de vidro.
No canto da sala o bar coalhado de todos os sabores alcoólicos possíveis. Eram muito diversos os gostos da galera: Desde “jararaca”, a caipira feita com álcool 90 graus, preferida por quem vivia ou vivera no mar, onde a bebida é persona non grata e sempre presente e se faz imperiosa a criatividade, até um legítimo escocês do Paraguai.
O cheiro da maconha incensava o ar misturado com dezenas de aromas de variadas procedências que usávamos para disfarçar, ou encobrir o indisfarçável. Mentíamos para nós mesmos, mas este era nosso mais íntimo comportamento.
Todos os preâmbulos de um teatro já muito vivenciado e a peça decorada em detalhes por todos nós, personagens calejados.Como no teatro alguém gritou:
- Merda!
Todos retribuíram o bordão de boa sorte. Neste palco a boa sorte seria não implodir numa overdose.
A fila formou-se rapidamente sem necessária chamada. Todos sabiam quando as carreiras, soldados mercenários de farda branca, apresentavam armas. Baionetas caladas com a qual nos suicidávamos lentamente. Uma estocada por dia, às vezes, como hoje, muitas, de todas as profundidades.
Os baseados cessaram. Chegara ao fim o tempo do “aperitivo”. Agora era a vez do prato principal. A mesa era baixa, nos ajoelhávamos diante dela para penetrarmos no mundo do poder. Nós, super homens enquanto abraçados ao pó, naufragados na criptonita branca quando o efeito se esvaía. Saí dali entusiasmado, berrando minha desconexão com a realidade como uma bandeira de vitória e também para sobrepujar os berros e gargalhadas dos parceiros.
Aos poucos o grupo se desfazia, cada um tomando seu rumo.
Na esquina Tomás abaixa as calças e balança a bunda para uma despedida criativa e hilária. Os que ainda seguiriam juntos abaixaram suas calças e retribuíram o tchau-tchau sensacional. Tomás era mesmo o cara. E fomos falando sobre ele até que nos esquecêssemos do que estávamos falando.
Abri a porta devagar. Encharcado de álcool, calibrado pela cocaína era meio complicado encontrar a fechadura rapidamente.
Com a garrafa na mão acendi a luz para certificar-me que era minha casa. Nem olhei para o conhecido sofá azul, mais urgente certificar-me da quantidade de líquido que restara a garrafa.
-- Pouca, meiota apenas.
Fechei a porta novamente e voltei à rua. Não sobre os passos que me trouxeram, já me perdera deles. Não marcavam uma linha possível de ser repetida, andariam conforme a vontade dos pés que tropeçavam sobre si mesmos.
As lojas 24 horas dos postos de gasolina foram um lance de marketing espetacular. Um CVV de primeira necessidade numa sigla um tanto diferente da original: Centro de Valorização do Vício. Eu era mesmo brilhante em minhas filosofias dedutivas. As noções se clareavam na mente e as idéias surgiam magistrais. Antes de entrar na loja dei outra fungada. Já estavam mostrando suas garras afiadas os pensamentos soturnos dos quais eu fugia. Fora de cogitação permitir que eles se sobrepusessem à minha vontade. Eu, o centro do mundo. Não, do Universo.
Comprei logo duas garrafas, me economizaria caminhadas que, eu sabia, se tornariam cada vez mais difíceis. Em casa outra vez. Que coisa indecifrável o caminho da casa, nunca o esquecia.
Todos dormiam, já não se preocupavam com tragédias, ela viria de qualquer maneira, uma questão de tempo ou sorte. Também não me procuravam nos lugares que eu freqüentava. Não eram bem vindos e tinham sido enxotados dezenas de vezes.
Eu não tinha muita certeza se ainda existia para eles, mas isso também perdera a importância desde que me deixassem em paz e não retomassem a chorumela de conscientização babaca e o faticínio de catástrofe iminente.
-- Que se fodam, panacas! – desejei enquanto bebia no gargalo para ser mais rápido o plá, ou zuim que eu buscava com sofreguidão.
Fiz várias carreiras, assim economizaria trabalho posterior.
Sábado. Domingo. Dias iguais. Única diferença o mergulho que alcançava a cada dia mais profundidade. Águas mais escuras e densas. Aos poucos a vida naufragava numa sucessão de dias que entraram as semanas num colar de pedaços de mim até que me arrastassem para a cama e me atirassem sobre ela desmaiado.
As crianças eram protegidas da infame visão, se é que ainda era possível ocultar o estado de molambo que me jogava pelas paredes até acertar o chão. Com uma capacidade incrível, conseguia sair para buscar mais garrafas. A maninha branca me dava arrimo e força.
O sofá tornara-se incômodo e estreito. Deixa rolar o chão móvel sob o corpo que se encolhe na falta de sono e alimento. Coisas quase inúteis e completamente sem sentido nos mareados dias de uso abusivo. Muito tempo depois me contaram que este tobogã feérico durara dez dias e se repetira um rosário de vezes. Terminavam com boa sorte, não me engolfavam definitivamente. Eu sobrevivia.
Todos me olhavam. Eu nada via. Rastejava igual aos vermes brancos, reais de alucinação, à minha volta. Sabia que era um deles, me comportava como um deles. Já perdera a firmeza das mãos nesse décimo, ou décimo quinto, ou centésimo dia. Eu não sabia mais nada sobre dias.
Desconhecia sol e lua se é que teriam existido ou se haveria diferenças entre eles. Isso fazia com que derramasse pó, polvilhando o assoalho. Não era permitido perder um só minúsculo grão invisível. Para impedir esse crime imperdoável eu lambia o chão enquanto rosnares simiescos saíam de minha garganta queimada pelo álcool e o nariz a arder cocaína.
Os odores sumiram. Sorte minha, não sentia o empesteado de minhas secreções já desmanchadas. Uma tentativa falida do corpo expelir os diabos com que eu o presenteava. Satã fazia cama na minha cabeça, na minha vontade e no excremento de gente em que eu me tornara: sucursal do inferno. O corpo me derrotava era o último pensamento robotizado que transitava pelo meu cérebro como estrela cadente e me lançava na noite suada e mórbida do desfalecimento. Meu corpo me salvava. Voltava, comia, me disfarçava de gente, aliviava o desgaste que se tornara insuportável e corrosivo. Ácido sulfúrico pastando e ruminando meus neurônios que apodreciam.
Tão logo recuperado a lembrança da primeira viagem com a deusa branca seduzia. A fascinação de revivê-la. Sentir-se acima e além do mundo ridículo e cruel. Sem imaginação.
Esse delírio, impossível de ser revivido me tangia para outras festas, novas e tão conhecidas orgias dos sentidos pagãos.
Recomeçar, desfalecer. Apodrecer arfar em busca do caminho de volta. Ciranda que de roda só tem o pó, o álcool e o abandono. Nenhuma cantiga de criança, nenhum gesto ou toque, nem sexo me envolvia mais. Apenas com a cocaína eu me deitava.
Até hoje não sei como atravessei essa ponte para o inferno sem me estatelar no abismo de pedras agudas que me esperavam para o empalamento.
Internações, fugas, recaídas. Nova ciranda, novo rio dos mortos para navegar.
Aos poucos, muito lentamente, agora com amparo dos companheiros, irmãos de desgraça que conseguiram se libertar, a minha consciência emergia ainda abalada, mas respirou através de mim.
Descer ao reino de Vulcano é fácil, o próprio peso do propósito ajuda a afundar. Voltar e escalar trezentos Everest, atravessar seiscentos Triângulos das Bermudas e milhares de ondas encapaladas, isso não era nem um pouco fácil e às vezes, o desânimo quase me fazia submergir de novo.
Hoje me sento aqui e seguro tua mão para te dizer que é possível, que este casamento que trazes nos olhos alucinados, na dificuldade de te manter sentado, não é indissolúvel. Este casamento foi sagrado pelo diabo que podes vomitar sabendo que o divórcio só será consolidado se for renovado dia a dia pelo resto de tua vida.
Falo-te vida com entonação maiúscula porque, como eu, esqueceste o significado dela. Por amor doentio e cruel, louco como estive, tu vegetas e perdeste o sentido do que é viver.
Estendo-te a mão por que alguém a estendeu para mim num dia em que a única saída era a morte. Não sou anjo, nem uma alma iluminada. Eu apenas já andei abraçado com o mesmo desespero que abraças agora.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A AMANTE - POESIA


para os parceirinhos que se afogaram no crack
meu coração despedaçado.



Envolta em véus incensados te mostraste.
Olhos perdidos no sem fim dos devaneios.

Quente, purpúrea, doce visão.

Abraço pagão no meu peito abrasado.

Em segundos a teus pés me tiveste.

Esqueci o dia, a noite.

O que era e o que não era,

só em ti enrodilhado.

Na cama de teu desejo caí flagelado.

Tuas pernas, de coxas nuas,

a me chamarem através das luas.

Quebrei os horizontes,

rompi as pontes,

roubei os atalhos,

contigo para sempre deitado.

O ruído do lá fora estancado.

Meu coração estalando,

as veias saltando.

Eu encontrei a vida, pensei em paixão.

Nada, nem ninguém de ti me arrancaria.

Foram-se os passares,

os andares que trilhei.

Crash, crack, escrancho.

Por tua androgenia me fascinei.

Espelho quebrado, cacos e sangue.

Alma vendida

furor parido.

Como me enganei!

SOLIDÃO E MEDO - UM DESAFIO A SER SUPERADO



A prática de muitos anos atendendo pessoas mostrou-me que a condição humana é bastante marcada, mais do que qualquer um de nós gostaria, pelo sofrimento. Estamos nele como os peixes nadam na água. A tristeza, o padecimento, a aflição brota para nós de diferentes fontes: problemas amorosos, sentimentais, afetivos, familiares; falta saúde, dinheiro, emoções, expectativas construtivas. A lista é longa e transborda de mágoas.
O que vem chamando minha atenção nos últimos meses, porém, é o aumento de uma queixa ligada à solidão. Excessiva, ela parece se adensar a cada dia de forma exorbitante, arrastando consigo homens e mulheres, gentes jovens, adultos, pessoas mais variadas, indistintamente.
Luxo atualmente é ter uma amizade. Simples assim! O teste maior do sucesso ou do fracasso de uma sociedade deveria ser medido pelo patamar do crescimento de vida solidária, em relação ao volume de troca humana legítima, socialmente útil e compensatória que ela promove. Uma sociedade justifica-se quando orientada para a lealdade, a confiança, o sentimento de segurança. Pensemos por um minuto. É isso que temos? Nossa vida comum cura ou dispersa o medo? Aumenta ou derrota a incerteza? A necessidade de fuga para algum lugar secreto se torna premente? Existe esse lugar?
Como resolver essa perplexidade? Não hesitar em alcançar um estado de conhecimento e clareza acerca da dor e da nossa própria finitude que possa, funcionando como conscientização da nossa precariedade, indicar que o desenvolvimento material que dispomos não representa nada se nos diluímos enquanto pessoa e deixamos os valores cardeais da condição humana escorrer das nossas mãos.
Compreender a singularidade do outro é indispensável para construir uma relação e permitir assim que se desdobre uma amizade verdadeira. Olhar o outro sem preconceito e de forma tolerante, nega o egoísmo e a superficialidade corriqueira dos relacionamentos humanos atuais. Precisamos deixar de querer ver estampado no rosto alheio um pouco daquilo que nós mesmos somos. Aceitar ver o outro tal qual é, sem medo de vermos a nós mesmos.
É um erro do acomodamento humano preferir modificar o outro, em vez de modificar a si mesmo. Devemos desprezar e reprovar menos. Escapar da lógica que exclui, para ampliar a diversidade das perspectivas humanas. Esse treino para a alteridade é o exercício que pode conduzir para fora dos nossos bloqueios defensivos. Abrir o horizonte de uma vida menos solitária, mais plena e repleta de significado e experiências interessantes.
Para o dependente significa esvaziar-se do medo de ser julgado e do terrível medo do contato com o outro que parece uma ameaça, uma traição iminente. A traição está na fuga, na solidão dos bares, das agulhas, dos comprimidos que prometem um êxtase escuso, do pó que entorpece e aprisiona.
Aceite-se e aceite a vida tal qual é, mesmo sabendo que ela não é justa. Não clame por justiça ou por compreensão se não consegue aceitar e perdoar a si mesmo e conviver consigo com alegria e sem medo de trair-se.

* Baseado em texto de Gold, Marina – Terra Esotérico

A DOR DA DEPENDÊNCIA


Companheiros,
Quem de nós sofreu ou sofre a maior dor?
Será que minhas dores são menores do que a de outros companheiros? Ou maiores? Será que dor pode ser mensurada?
Estamos preparados para suportar a dor que outra pessoa está suportando?
A dor vem sob medida?
Ouvi várias vezes em reuniões de A.A.: "Deus não nos manda uma dor que não possamos suportar", ou frases parecidas com esta. Muitas vezes achei quase uma ofensa.
Um padrinho, sábio e irritante costumava dizer para mim e quem mais estivesse precisando de apadrinhamento: "Vai passar". Irritava porque é como se ele não desse o devido valor à minha dor imensa, insuportável e, com certeza, eterna. Pensava eu enquanto não via possibilidades e achava que a vida estava acabada dentro de uma garrafa. Ele diminuía o valor da dor dizendo que ela era temporária. Não podia acreditar.
Tenho dores que parece não passar. Há três anos tive uma perda de um ente querido e que todos os dias, eu digo, todos os dias, todos, sem exceção, todos os dias, isto dói. Ás vezes dói menos, às vezes mais. Às vezes parece insuportável. Às vezes eu choro perdidamente. Ninguém vê onde quebrou, onde amassou, porque é que está doendo. Às vezes eu tenho que falar disso com alguém, ajuda a espera de dor passar.
Preces ajudam. Entrar na Internet para tirar de minha cabeça as besteiras que passam por ela... Me agarrar com meu marido que está perto e sabe como sofro. Dói nele também, mas ele sabe que em mim dói mais. Talvez porque eu não tenha todos os anos de sobriedade que ele tem, talvez porque ele tenha outras dores que doem ainda mais.
E tem dor, tem medo que eu nem posso partilhar com ele. Tenho que me fazer de forte. Mas eu não sou assim tão forte, nem tão sóbria, nem tenho tanta fé. Mas eu preciso ter. Eu estou tentando. Escolhemos essa dura partilha e temos que nos fortalecer mutuamente. Desde que meu companheiro partiu sem volta, minha cabeça roda e todos os medos escondidos debaixo do tapete saíram e ficaram expostos.
Eu nunca estive em acidente de carro, nunca perdi um emprego, nunca fiquei sem casa, nunca dormi na rua, nunca isto, nunca aquilo. Mas eu te garanto, eu já sofri à beça. Nem todo meu sofrimento foi porque eu estava bebendo, mas eu bebi muitas vezes porque eu estava sofrendo e achava que bebendo ia fugir da dor. Não deu certo. E a coisa inverteu: a bebida trouxe mais dor.
É muito complicado. Mas acho que o filósofo Caetano explicou: cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é. Cada um com sua dor. Cada um de nós sabe o quanto custou chegar até aqui. Algumas pessoas têm a mania irritante de quando se está mesmo para baixo, precisando de compaixão, de alguém que entenda... etc. dão sempre a mesma tarefa: a lista da gratidão. Era para eu listar as coisas pelas quais eu estava agradecida. Na primeira vez que recebi a tarefa eu estava tão brava e tão longe de estar sóbria, embora não estivesse bebendo, que eu achei que não ia ter nada para listar. Não que eu não tivesse nada, embora eu achasse que não tinha nada. É que eu não estava agradecida por nada.
Mas o tempo passa, fui, lentamente me afastando da garrafa, a consciência de que o tamanho da dor era infinitamente aumentado por ela. O álcool traz depressão quando o corpo grita por ele. Só quando estamos no meio do furacão é que não vemos assim. É tão cômodo sofrer e lastimar! Isso permite que beba de novo e de novo. A dor como eu a via era fruto de minha dependência.
Tenho dores, todos têm. Sem ela talvez a vida nada acrescentasse porque somos muito pequenos, quase crianças ainda e não valorizamos aquilo e aqueles que nos cercam. A dor não é castigo dos céus, ela é processo de aprender a ser feliz.
A dor não é falsa quando se manifesta, embora possa ser criada, ou aumentada.
E creia, é bem mais fácil criar alegria, bem mais útil e bem mais leve.
Não leve sua dor tão a sério, não vale a pena. Saia da garrafa, ou da droga. Isso vale a pena.